sábado, 4 de junho de 2011

A RAINHA DO PALÁCIO DE ESPELHOS

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Hoje olho para este espelho e sinto saudades da minha última visita à cidade dos sonhos




A que realizei montado em cavalos alados




Desta vez o pássaro dos sonhos tinha se transfigurado em pégasus galopantes




Pois havia muita urgência, e era preciso a transfiguração mais veloz da beleza para que a viagem durasse o tempo de um piscar de olhos




Apesar da grande fugacidade das imagens que não chegavam a se completar perante meus olhos de "menino-gente", era possível ver que em nuvens os pégasus pisavam com uma suavidade aparentemente impossível




Havia muita urgência no bater daquelas asas




Ainda que tão alvas como o mais belo amanhecer, eu conseguia ver a ansiedade ritimando o cavalgar daquelas lindas projeções do grande pássaro dos sonhos




Dividido em tantos para mostrar a grandeza de ser um em muitos




Enfim... Quando finalmente as imagens começaram a desacelerar




Eu percebi que estava me aproximando de uma linda ilha de espelhos




O mais belo era o contraste do mangue, ele a cercava por todos os lados




E era rodeada por grandes caranguejos




De tamanhos tão assustadores como nunca antes vira na vida




Eu pude ver como agora o meu reflexo pousar




O grande pássaro dos sonhos voltara a sua condição anterior




E me escoltava para o centro daquele quadrado de espelho, aparentemente sem razão.




- Qual o sentido desse espelho no meio do mangue?




- A beleza não precisa fazer sentido... Você não percebe que dessa forma o céu se aproxima um pouco do chão?




- Verdade. Mas é injusto que o mangue também não seja refletido lá em cima, afinal a beleza dele é menos aceita, e talvez fosse possível vê-lo refletido em alguma nuvem, respeitaríamos mais a sua razão de ser.




- A sua sabedoria e capacidade de ver a real natureza das coisas é que te faz meceredor das cidade dos sonhos.




- Não sou sábio... Não vejo a razão desta ilha. Por que estamos aqui?




- Você já viu... apenas não enxergou... Olhe para baixo. O que está vendo?




- Nós dois refletidos no espelho.




- Olhe além de nós, deixe de se enxergar e encontrará o sentido de ser reflexo.




Naquele instante eu percebi que enxergar além de nós é algo que ao primeiro olhar é impossível, mas basta um pouco de generosidade e um mundo inteiro se constrói em nossa frente. E foi assim, de repente a minha imagem desapareceu no espelho e um grande palácio de espelhos emergiu erguendo a ilha. A transfiguração durou apenas o tempo do meu espasmo de surpresa... Rapidamente um reino inteiramente feito de espelhos cobriu o mangue, cercado por muros brancos, tão grandes que seria impossível qualquer criatura viva entrar sem autorização.




Um papagaio de um verde intenso, rompe a imensidão branca arquitetada à nossa frente e se torna a segregante imagem da paisagem. Estendi o braço e ele pousou.




- A rainha espera ansiosamente por vocês.




Fomos conduzidos para dentro do palácio, o palácio que já era grande se ampliava ainda mais com os espelhos. Passamos por várias salas até finalmente sermos colocados diante da rainha. Tratava-se de uma senhora de olhar intrigante, não era possível olhar neles sem que me visse. Seus olhos eram também de espelho. Por isso tornava-se difícil olhar profundamente naquela rainha.






- Você é o menino-gente com olhos de poema, responsável por grandes transformações na cidade dos sonhos?



- Eu não penso ser responsável por nada.



- É na falta de pretensão que está o segredo da mudança... Quando menos pensamos afetar as coisas, mais as atingimos intensamente.



- Eu creio, majestade, que não possua nenhum poder para tanto, talvez uma rainha como a senhora possa ter dimensão do que causa, mas eu... Eu não sou nada.



- Esse é o maior equívoco... É preciso que se inverta o olhar para que se enxergue o verdadeiro poder. O que são os espelhos senão uma forma de se enxergar o poder?



- É por isso que tem tanto espelhos? Para se sentir poderosa?



- Os meus espelhos não servem para mim... Veja os meus olhos, o que eles refletem?



- A minha imagem.



- Pois bem... Como poderia eu enxergar a mim, se os meus olhos servem para que a imagem dos outros exista?



- Então não consegue se enxergar Rainha...



- Liah...



- Ilha... Até o seu nome é uma inversão da palavra "Ilha".



- O que quer dizer com isso?



- Liah é ilha de forma desordenada não é?



- É.



- Algo me diz que o seu nome não é a única coisa desordenada para parecer outra coisa por aqui.



- Se eu pudesse refletir os seus pensamentos agora, certamente leria uma porção de coisas que sempre hesitei ler.



- Mas um dia é preciso refletir a verdade. E é contraditório que uma Rainha de um Palácio de Espelhos tenha medo da verdade. A verdade não combina com espelhos.



- Prossiga.



- Não vejo razão em se morar em uma ilha de espelhos... Não consigo entender qual o sentido de ser ilha, habitar um mundo branco quando se pode ter conexão com tantas coisas coloridas. Posso fazer uma pergunta?



- Não tenho como impedir a voz sincera do teu coração.



- Foi por solidão?



- Difícil responder se a solidão é a construtora dos nossos palácios quando nunca se teve outra condição adversa na vida. Sei apenas que essas paredes multiplicam a menor presença que exista, os meus objetos viram muitos outros objetos e eu sinto como se houvesse companhia.



- E quando foi que inverteu os seus olhos, empurrando para dentro a parte mais sensível e trazendo para forma essa proteção que não permite com que se enxergue?



- É... Realmente você é a excessão necessária a qualquer mundo. Eu não sei... Talvez tenha sido alguma dor dessas que uma vez é o suficiente para que corrijamos a vida toda. Pode ver que não tenho muitas respostas para o que sou... Mas começo a entender que os meus espelhos refletem muito mais do que as aparências que tanto tentei usar como proteção.



- Você não precisa refletir nada que não seja espiritual... Traga o reflexo da sua alma para fora e as pessoas serão espelho dela. É preciso fazer uma inversão nas letras do seu nome, dos seus sentimentos, da suas motivações, para que a felicidade seja a sua imagem rebatida.






Neste instante eu vi que havia realmente feito uma transformação, a rainha estava certa quando disse que tocar não é uma questão de desejo... Os olhos de espelho da rainha se voltaram para dentro e eu podia ver a sua alma... Finalmente o seu poder ofuscava todos os espelhos, que pararam de refletir o material. Agora a Rainha aparecera quebrando qualquer imagem sem propósito.



Eu voltava para casa feliz... A compreensão daquilo que eu projeto diante do espelho se tornou muito mais clara para mim.



























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