O que acontece quando se tenta aprisionar uma ave selvagem...
Que possui instintos maiores do que qualquer entendimento?
Corre-se o risco de aprisionar naturezas
Ainda que as gaiolas criadas por você sejam feitas dos melhores sentimentos
Dos mais nobres motivos...
Por detrás de toda proteção em demasia
De toda necessidade de contemplação isolada da beleza
Há a sombra de um egoísmo
Que se esconde tão bem nas frestas do amor, da dedicação...
É quase invisível o mal intrínseco em toda benevolência
O fato é que cedo ou tarde você precisa fazer uma escolha
Ou deixa que a natureza dos pássaros selvagens seja a regente do destino deles
Ou você continua aprisinando até que eles se percam, definhem no caminho ilusório do seu amor
Esse é um poema feito em despedida
As aves chegam, pousam em nosso ombro...
Encantam-nos com a sua liberdade...
Mas precisam retornar ao primitivo ancestral da sua gênese
Quero apenas que leve em seu bico esses últimos versos
Tão cheios ainda de esperanças desnecessárias
De acúmulos e viagens lindas por tuas asas
É chegado o tempo de te ver sumir no horizonte
De olhar para o céu e enxergar apenas revoadas
Porque todos os pássaros juntos são iguais
Um conjunto belo, porém, sem individualidades...
E eu amo seres vivos que me deslumbram por seu voo único
Todo último poema à memória de algo tem sempre um tom triste de partida
Quase fúnebre, doloridamente silencioso...
Os meus olhos passarão um tempo sem procurar no céu
A imagem de um momento refletido em nuvens
Sem querer nada além da paz que existe num horizonte aberto
Quem sabe um dia um pássaro qualquer pode pousar em minha janela
E sentir alegria ao me ver dormir
Nesse instante eu também sentirei o som novo de um canto
Um espanto doce de ser observado
Por quem hesita em se aproximar dos homens
E dessa vez eu não criarei gaiolas
Muito menos armadilhas para beija-flores
Deixarei apenas que venha quando a minha janela for a que melhor
A que mais se enfeita e alegra para receber visitas inesperadas...
Infelizmente, assim como os pássaros, os poetas não conseguem viver sem pouso seguro
E tão logo esse poema de despedida se encerre
Um novo tempo para as aves e os sonhos começará
E eu não mais sentirei a presença de um passado
Que me pegava pelo bico e me fazia horas feliz
Tudo ficará longe... Como a ave que some...
Que fica pequena, até não ser nem mesmo um ponto nas cores de um entardecer
Para mim toda história começa e termina com palavras
Elas são a areia que jogo para cobrir o que morreu ou deve morrer
Pássaros... Passararão
Pássaros... Passararão
Então, vou adormecer agora...
Para quem sabe amanhã ter alguma surpresa cantando na minha janela.
Uma ave que queira aproximar a sua natureza selvagem
Da minha natureza...
Essa que está aprendendo a respeitar... Deixar partir...
O que de fato nunca nos pertenceu
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